terça-feira, 13 de maio de 2008

Os batalhões rivais

Por motivos óbvios havia uma velha rivalidade entre os garotos da rua de cima e os da rua de baixo. A rua de cima era o bairro Santo Antônio, e a rua de baixo era o outro lado da banca, envolvendo o bairro Alagadiço. A banca fazia a divisão; e era em cima da banca onde acontecia o confronto entre os dois batalhões. Nessa história sempre havia um que comandava o grupo, e que mandava um recado verbal aos garotos do outro lado da banca: “Diga aos meninos da rua de cima que, às oito horas da noite do dia tal, iremos nos encontrar e tirar nossas diferenças; diga a eles que se preparem para brigarmos”. Assim, eram formados dois batalhões de meninos armados de paus e pedras, com o objetivo de travarem uma luta corpo-a-corpo. A gente se organizava em grupos de brigada; e cada pelotão tinha um comandante que dava as ordens.

O campo de batalha era a banca, no trecho compreendido entre a Praça da Mônica e a Praça Dom Thomas. Ali, o “pau quebrava”. A “refrega” começava com os dois grupos atirando pedras um contra o outro. Quando as pedras acabavam, era o momento de atacar com varas à mão. A vara servia como espada para ataque e defesa. A batalha chegava ao fim quando um dos batalhões resolvia “bater” em retirada. Alguns chegavam a casa feridos ou sangrando, e dizia aos pais que foram atacados na ruas por elementos maus.

Rivalidade maior era a que existia entre os garotos de Juazeiro com os garotos de Petrolina, e o ponto de encontro onde se travavam as batalhas era a Ilha do Fogo, que fica situada no meio do rio São Francisco, entre as duas cidades. Essa briga era mais ferrenha. De um lado estava o grupo de garotos baianos, e do outro lado o grupo dos pernambucanos. Essa batalha era mais perigosa, porque os garotos, tanto de um lado quanto do outro, usavam armas perfurantes como canivetes, espetos de churrasco e garfos, além de porretes, correntes e cabos de aço.

Quando a briga era contra os pernambucanos de Petrolina, os dois grupos das ruas de cima e de baixo se uniam para defender o nome de baiano. O batalhão que estava em desvantagem teria que correr desde a Ilha do Fogo até à cabeceira da Ponte Presidente Dutra. Alguns eram hospitalizados com ferimentos generalizados. Aconteceu de eu participar de brigas de rua, quando eu ia ao Cine Petrolina, aos domingos. Alguns elementos me reconheciam na saída da casa de projeções, e convocavam outros para me atacarem. Eu me saia bem, porque tinha noções de capoeira e boxe. Em uma dessas “refregas”, fui atingido na coxa da perna direita com um golpe de faca, que foi desferido por um dos dois elementos que me tocaiaram ao lado da agência dos Correios e Telégrafos de Petrolina. Mesmo ferido, corri até a Ilha do Fogo sendo perseguido pelos dois adversários, que se detiveram temendo aparecer algum juazeirense naquele momento. A Ilha do Fogo é a fronteira de limite entre Juazeiro e Petrolina; Bahia e Pernambuco. Também, quando os juazeirenses perseguiam os petrolinenses, ao chegar a Ilha do Fogo eles respeitavam a fronteira, retrocedendo. Em uma dessas brigas, na Ilha, eu tomei uma garfada na região glútea e não senti no momento, pois o sangue estava quente. Somente depois de uma carreira até a cabeceira da Ponte, um dos companheiros de batalha exclamou: “Êita, Wilson!... você está com um garfo espetado em sua bunda” (nádega) No momento de retirar o garfo do bumbum, foi aquele “Deus de acuda”. Todos queriam puxar o garfo, e eu não deixava ninguém tocar. Dei muito trabalho para permitir alguém retirar o garfo que estava fincado na região glútea.

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